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DODGE CHALLENGER: UM DESAFIANTE DE PESO

Estados Unidos da América. Meados da década de 60. As músicas de letras românticas começam a dar lugar a um ritmo mais subversivo, com mensagens que contestam a guerra do Vietnã e conclamam os jovens a viver com liberdade. O país está mudando. A cultura está mudando. O american way of life está em colapso.

Esse novo período pedia automóveis mais agressivos. A conjugação de fatores como estilo e muitas polegadas cúbicas sob o capô recebeu um nome igualmente forte: muscle car. E o melhor: eles custavam pouco. A parti daí, o mundo não seria mais o mesmo.  

Existem algumas controvérsias sobre o início dessa nova “escola” de carros esportivos. John De Lorean criou o Pontiac GTO, aclamado por muitos como o primeiro representante. Os motores de bloco grande, os chamados big blocks, por sua vez, surgiram ainda na década de 50.

De qualquer modo, a história não tinha a menor importância para a juventude contestadora e ávida por muita potência debaixo do pé direito. Nos – quase – dez anos seguintes o público teria várias opções, de diferentes marcas. E com muita gasolina barata para queimar pelas ruas.

A Mopar, abreviação de Motor Parts, colocou o Plymouth Barracuda nas concessionárias. E o modelo, assim como o peixe de apetite voraz, fez sucesso entre a molecada. Mas o personagem dessa matéria só chegaria no final da década, balançando o mercado com a força de um furacão: o Dodge Challenger. A concorrência teria sérios problemas.

Ele tinha um estilo único, grande capô – com tomadas de ar – e linhas mais do que atraentes, além de quatro faróis incisivos na dianteira. Isso ajuda a explicar sua “cara de mau”.  O bólido utilizava a carroceria E-body, também chamada pelos fãs de coke bottle, devido a seu formato singular.   

O projeto de um novo carro nasceu nas pranchetas da Chrysler em 1967. Vários desenhos e muitos croquis mais tarde, Bill Brownlie, o chefe do setor de design, deu seu toque de mestre e acabou agradando a toda a diretoria. O “desafiante” se tornava realidade, e chegaria às lojas três anos mais tarde.

Depois de falar na forma, começaremos pelas opções de motorização. O comprador tinha uma vasta lista de propulsores à sua escolha. Precisamente, eram nove. Partindo do bloco – quase sem graça – de seis cilindros até o poderoso 426 Hemi, por apenas US$ 1.228 a mais.

Na internet podemos encontrar de tudo. Procurando por lá achei a brochura original do carro, com todas as suas especificações técnicas, configuração de carroceria e motores. Nesse ponto, existe um comparativo com os cinco maiores rivais do período. E o Challenger sai ganhando.  

Não podemos falar de um muscle car sem citar o tamanho do bloco. Isso é quase imperdoável. Para o leitor ter uma idéia, o motor de seis cilindros tinha 225 pol³, chegando aos V8 de 318, 340, 383, 440 e – o já citado – de 426 pol³. Perdeu o fôlego? Isso é só o começo.

Se a Mopar é uma religião, o propulsor Hemi é cultuado como um de seus maiores deuses. Na verdade o primeiro motor com esse tipo de configuração foi criado para o P-47 Thunderbolt, caça da Segunda Guerra Mundial. O similar automotivo foi desenvolvido nos anos 50 e sua maior característica é ter a câmara de combustão hemisférica – daí o nome – e um espaço maior entre as válvulas. Na prática, isso é sinônimo de desempenho.

Basicamente falar em um muscle é falar em paixão. E o modelo desperta esse tipo de sentimento. Basta pensar em algo rápido, imaginar a pegada do volante de três raios, a alavanca de câmbio Hurst com quatro velocidades e as saídas duplas de escapamento. Então gire a chave e ouça o ronco encorpado do big block. Pise fundo no acelerador e verá o que ele é capaz de fazer. Enrugar o asfalto me parece a palavra adequada para descrever a sensação.

Controle as batidas do seu coração. Ainda tem mais. Em 1970 o Challenger vendia muito bem. Só neste primeiro ano 80 mil deles invadiram as ruas e estradas. A empresa então colocou no mercado o six-pack. O “pacote” – restrito a algumas versões – incluía um motor 440 V8 com nada menos do que três carburadores. Resumindo: um verdadeiro beberrão. Mas gasolina – ainda – não era um problema.

E por falar em versões únicas e limitadas, o T/A – que significa Trans Am – marcou época, com seu estilo ousado e cores chamativas. Para afastar – ou chamar – eventuais adversários pra briga, o bólido esbanjava agressividade. Preto fosco e saídas de escapamento laterais faziam qualquer um pensar duas vezes antes de emparelhar com ele no semáforo.

O esportivo era equipado com um 340 V8 e o six pack, citado dois parágrafos acima. Pouco mais de dois mil exemplares foram produzidos e aproximadamente novecentos continuam rodando hoje em dia. Isso o torna raro e cobiçado pelos colecionadores.

O Challenger também é lembrado pelos aficionados por cinema. O cult “Corrida contra o destino” é item indispensável para quem gosta de um típico filme norte-americano, recheado de perseguições e muita borracha queimada. Ele conta a história de um veterano de guerra que atravessa os Estados Unidos para cumprir uma aposta.

O problema é que o herói acaba se envolvendo em problemas com a lei e o carro – que rouba a cena – voa baixo atravessando o país. O original é de 1971, com Barry Newman, e um remake foi feito em 1997. O final é eletrizante e arranca lágrimas da platéia. Até mesmo dos marmanjos.

 Mas o combustível farto e barato estava com os dias contados. Em 1972 o “Hemi”, o 383 e o 440 deixaram de ser oferecidos ao consumidor. Mau presságio. No ano seguinte o valor do barril decolou e o precioso líquido começou a ser vendido a preço de ouro. Crise geral.

As filas aumentaram e os muscle cars foram hostilizados pelos proprietários. O modelo sobreviveria apenas mais um ano. A empresa então deixou o 318 V8 como opção única. Mas ninguém queria um carro igual a todos os outros. Foi o seu fim.

O Dodge Challenger fez história em sua época, seja pela potência dos motores, linhas musculosas, ou, simplesmente, pelo fato de que mesmo parado ele parece estar sempre pronto para uma arrancada. Por esses – e outros motivos – encerro o texto com a frase gravada no coração de todo apaixonado pela marca: Mopar or no car.

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Renato Bellote, 44, é jornalista automotivo em São Paulo e colunista dos portais IG e Carsughi. Nesse canal traz avaliações a bordo de clássicos, superesportivos, picapes e modelos atuais do mercado.

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